FLISOL sem Ubuntu: explicando

A comunidade GNU/Linux mais ativa do Brasil está irritadíssima com a campanha do #FlisolSemUbuntu. E não poderia ser diferente, afinal de contas, alguém decidiu se opor a sua distribuição favorita. É como se alguém tivesse feito uma campanha contra seu time de futebol. Irrita mesmo.

Essa raiva se expressa de várias formas, e a mais evidente é a reação exagerada e a geração de FUD – Fear, uncertainty and doubt. Assim, em vez de esclarecer as coisas, elas se complicam mais ainda. Meias mentiras são propagadas de forma a desacreditar o recado original, gerando confusão, medo e dúvida. Esses são os \”sabuntadores\”

Vou tentar esclarecer os pontos mais polêmicos e ver se ajudo a contrapor os \”sabuntadores\” de plantão.

1 – Vocês estão segregando os usuários de Ubuntu do FLISOL!

Mentira pura. Se você tomar o cuidado de ler a minha petição por um FLISOL sem Ubuntu e a recomendação do \"flisol_sem_ubunu\"Thiago Paixão, perceberá que o foco está na instalação de Ubuntu pelo FLISOL, nada mais. Usuários de Ubuntu poderão, deverão e serão recebidos com muito amor e carinho, da mesma forma que são recebidos usuários de outros sistemas operacionais.

Faz parte das regras gerais do FLISOL receber e atender qualquer pessoa que queira instalar Software Livre em qualquer sistema operacional, mesmo Windows ou MacOS. Então como assim estamos propondo uma segregação dos usuários de Ubuntu? Eles são muito bem-vindos! Serão ajudados como qualquer outra pessoa.

Sei que parece difícil de entender, mas o que estamos pedindo é que um evento de Software Livre não instale a distribuição que mais confronta o próprio Software Livre. Assim a recomendação é para que os voluntários do FLISOL não instalarem Ubuntu e dediquem boa parte do seu tempo explicando aos iniciantes os motivos.

Então imagens como esta ao lado, apesar de engraçadas, são puro FUD. Se você usa Ubuntu, vá ao FLISOL! Participe, converse e descubra opções 100% livres ou menos daninhas do que o Ubuntu.

2 – Porque a implicância com o Ubuntu?

Porque a Canonical tem um longo histórico de ações amorais e anti éticas que a confrontam a filosofia do Software Livre. Uma hora alguém tinha que achar ruim. Por mais que tentem minimizar a gravidade, é muito sério instalar spyware em um sistema operacional popular, sem dizer nada a ninguém. Não há justificativa. Trata-se de uma quebra de confiança mercadológica. E criar um botão para desativá-lo não mitiga em nada o problema.

É como ser traído pelo cônjuge. Depois de consumada a traição, a relação de confiança se desfaz. Há quem supere e perdoe, mas no caso da Canonical, sequer desculpas foram apresentadas. Na verdade, o posicionamento da empresa foi de fundamentação da ação, justificando-a como método comum do mercado e tentando desqualificar seu críticos. Resumindo: \”trai sim e daí? Todo mundo faz isso, então não reclame.\” Isso pode ser aceitável para você, mas não é para quem defende o Software Livre: primeiro a liberdade do software e depois os negócios.

Some a isso o fato do Ubuntu embutir drivers privativos no kernel linux sem te avisar. Parece mágica! Quando instalo Ubuntu tudo funciona de primeira, mas quando instalo as outras distribuições não. Bom amigão, hora de acordar: não é mágica, é software não livre embutido no sistema operacional sem nenhum alerta para você. Como isso pode ser bom para o Movimento Software Livre?

Considerando que o Windows tem Software Livre embutido e o Ubuntu tem software não livre embutido, que os diferencia é a quantidade de software não livre?

3 – Mas outras distribuições também tem \”blobs\” privativos, então focar só no Ubuntu não é hipocrisia?

Não é. Há níveis de gravidade e de adoção de drivers privativos em cada distribuição. Seria um injustiça absoluta colocar o Debian no mesmo \”balaio\” do Ubuntu. Até mesmo o openSUSE não vem com muitos dos drivers privativos que vem no Ubuntu.

Se fizéssemos uma campanha de ação condenando absolutamente todas as distribuições que usam drivers não livres, seríamos taxados de radicais, utópicos, \”sem noção\”, sonhadores… e seriamos automaticamente ignorados. Então decidimos focar na distro que mais agride os princípios do Software Livre.

A rigor, nenhuma distribuição contendo nenhum componente não livre deveria ser instalado no FLISOL. E o objetivo é chegar lá, ou melhor, voltar para lá, porque estou convencido que os idealizadores do FLISOL, quando pensaram no formato e nos objetivos do evento, jamais incluíram deliberadamente a ideia de distribuir software não livre. Um dia, seremos uma comunidade forte e consciente capaz de pressionar os fabricantes de hardware a liberarem seus drivers e essa discussão não será mais necessária.

Mas eu não acredito que conseguiremos pressionar os fabricantes de hardware a liberarem seus drivers usando massivamente seus drivers não livres.

Até lá teremos que dar um passo de cada vez. O primeiro é não instalar Ubuntu. Amanhã, poderemos ampliar o espectro de distribuições, quem sabe? Mas o objetivo certamente é ter um FLISOL que só instale e dissemine Software Livre.

4 – Mas e a liberdade de escolha?

Interessante que depois de tantos anos, esse argumento ainda encontre espaço em nossas comunidades. Você sabia que a Microsoft, em 2004, fez uma campanha que usava esse mesmo argumento para conter o uso de Software Livre no Governo Federal? \”Campanha pela liberdade de escolha do software\”.

Software Livre não defende a liberdade de escolha. Defende a liberdade do software. Escolher ser um prisioneiro do software privativo não é uma opção válida para quem defende a liberdade do Software. Por que? Ora, por que escolher usar um software não livre, tolhe sua liberdade, e aqui estamos preocupados com a liberdade do software.

Existe um movimento que tenta se confundir com o Software Livre, chama-se OSI – Open Source Initiative, que defende a liberdade de escolha. Eles são mais maleáveis e complacentes na convivência com softwares não livres. Em geral eles se preocupam mais com os negócios, o mercado e a comodidade do usuário, mesmo que isso represente usar software não livre. Mas isso não é Software Livre, é OSI. Se você acha que esse é um caminho válido e positivo, então talvez seu \”lance\” não seja Software Livre, mas OSI.

Mas perceba o nome do evento: FLISOL, e não FLOSI 🙂

Se quer pregar a liberdade de escolha, perfeito! Mas lembre-se que isso não é Software Livre.

5 – Quanto mais gente usando melhor!

Os \”sabuntadores\” dirão que devemos sim instalar software não livre para ajudar na massificação do uso do Linux e que então, uma vez massificado o Software Livre prevalecerá. E esse argumento é uma tremenda confusão em si mesmo:

a) Como assim distribuir algo ajuda a popularizar a antítese desse algo? Exemplificando: como assim distribuir cigarros ajuda a combater o tabagismo?

b) O Linux, o kernel, já esta sendo distribuído com centenas de drivers não livres a muito tempo. E cada dia ele tem mais e mais software privativo dentro. Tanto que foi criado um fork do projeto que se chama linux-libre, cujo símbolo é um pinguim \”limpinho\” :-). Então quem quer mesmo massificar o uso de \”linux\”?

c) O argumento da massificação parece perfeito em tese, mas na prática tem se mostrado absolutamente errado. Se o objetivo é atingir massa crítica para pressionar desenvolvedores e fabricantes de hardware e liberar seus códigos, o que estamos vendo é o oposto disso. Veja quantos bilhões de usuários de Android, que no fundo é \”Linux\” e nenhuma reação contrária aos Software Privativos Na verdade aconteceu o oposto, o Android cada dia é mais fechado e a disseminação de apps não livres reina absoluta e cresce diariamente.

O que dizer então do Ubuntu com sua base de instalações que já passam de 20 milhões no mundo todo? Não é meio estranho que a maior e mais atuante comunidade de usuários seja da distribuição que menos respeita a filosofia do Software Livre? da que menos respeita a privacidade de seus usuários? A que mais favorece os fabricantes de hardware distribuindo silenciosamente seus drivers não livres embutidos no kernel?

 

A grande maioria de nós caiu nesse \”conto do vigário\”, eu incluído. Usei Ubuntu por anos e até me convenci de que um pouco de software não livre poderia ajudar o Movimento Software Livre e a causa. Eu mesmo usei o acrônimo falacioso \”FOSS\”. Eu estava errado. O que se viu nos últimos anos foi um crescimento exponencial no uso de software não livre, o enfraquecimento das comunidades atuantes que foram cooptadas pelos serviços privativos on-line, pelas distribuições recheadas de software privativos e de lideranças confusas usando ícones do Software Privativo como Gmail, Facebook e iPhone.

O Movimento Software Livre sempre foi de vanguarda, questionador, disposto ao embate intelectual e sempre alinhado com seus preceitos filosóficos. Acredito que a Canonical e seu Ubuntu são os maiores responsáveis pela sabotagem que estamos sofrendo: se por um lado aumenta o número de usuários, do outro diminui a importância dada à liberdade do software.

A pergunta que deixo para vocês é: quem ganha com o enfraquecimento ideológico do Movimento Software Livre?

Desejo a todos um excelente #Flisol2015 mas que seja um #FlisolSemUbuntu !

Saudações Livres!

17 comentários em “FLISOL sem Ubuntu: explicando”

    1. Mas o software livre surgiu pela liberdade do software e a quem supre a necessidade de que o software seja realmente livre.

  1. Caramba!
    Quanta besteira num texto só.
    Os argumentos não são lá nada convincentes, além de afirmações e opiniões frívolas.

    P.S: Não uso Ubuntu – se pensarem que o estou defendendo.

    1. É muito estranho esse camarada, tô vendo a hora dele nos sugerir trabalhar com máquinas de datilografia em prol da “privacidade”.

  2. Leandro Souza

    Quer dizer que a ideia que voltemos no tempo e nos tornemos todos espartanos tendo que compilar kernel e libs para que possamos ter um hardware funcionando? Hj quando instalo um ubuntu é pra logo comecar a trabalhar. Sem tempo/paciencia pra ficar compilando kernel.

  3. Um pequena crítica aos usuários de distribuição: O FLISOL é sobre software livre baseados em GNU/LINUX, correto? Logo, Linux é uma marca registrada do Linus Torvalds que dá nome do KERNEL, não a distribuição. O KERNEL é a única coisa imparcial em qualquer distribuição, o resto é puxação de sardinha. Todos os protocolos de segurança, comunicação, requisição e interrupções são ativos, configurados, e desenvolvidos no KERNEL, qualquer outra coisa usa esse como base, caso contrário não funciona. Então senhores a principal importância fórum, a meus ver, é garantir o melhor desenvolvimento daqui que é importante e comum a qualquer distribuição, o resto é secundário, visto que aplicativos são mais destinado a fins comerciais, ou seja, aplicativos free que geram riqueza e velocidade em empreendimentos.

    Sabe, eu estou cansado de ver gente filosofando sobre a porcaria de uma ou outra distribuição como se isso fosse importante. Vocês já viram alguém que tem filhos, carros, imposto de renda a pagar todo início de ano, propriedades e mais impostos e ainda trabalham com TI e sistemas GNU/LINUX ficarem discutindo parnasianismo.

    Está mais que na hora de para com essa ladainha e mostra resultados financeiros. Querem vender a ideia de que software livre vale realmente a pena? Então demostre resultados financeiros a empresários e banqueiros. Pronto. Até lá, é só demagogia.

    1. Wellton Costa

      um adendo: O FLISOL é sobre software livre baseados na filosofia GNU….. não necessariamente GNU/Linux… esse ano de 2016 será GNU/Linux-libre com certeza. Nada Linux, o kernel linux não é software livre há décadas.

  4. Excelente texto, Anahuac sempre profundo e sincero. Adorei essa parte:

    “Mas eu não acredito que conseguiremos pressionar os fabricantes de hardware a liberarem seus drivers usando massivamente seus drivers não livres.”

    Concordo em gênero, número e “degrau”, a mentalidade capitalista só enxerga uma coisa: leia da oferta e procura, se os drivers proprietários servem para a maioria, pra que se preocupar em liberdade e respeito ao usuário, vou continuar a vigiá-lo e fazer o que eu bem quiser.

    E acho que não é ser radical ao abandonar os softwares e serviços proprietários e antiéticos, eu por exemplo, vou aos poucos limpando o que não serve, em termos de software e serviço proprietário, até ser 100% livre.

  5. marcio oliveira

    Muito bom! Bom mesmo! Rigor é o fundamento. A defesa de valores básicos é a salvação da humanidade — em todos os sentidos — principalmente nos aspectos ambientais e produtivos.

    Senti, falta de uma abordagem em “o que fazer” e não apenas no que “não fazer”.

    Quais as alternativas aos ícones no software nom-livre?

    O que temos a oferecer? Ou pelo menos, o que temos a propor?

    Note que, mesmo na filosofia clássica essa preocupação aparece — em Racionais Mc’S se escuta: “- Então, vocês que fazem o RAP aí, são cheios de ser professor, falar de drogas, policia e tal, e aí, mostra uma saída, mostra um caminho e tal, e aí..?”

    1. No caso do Android, tente usar replicant (se possivel, pois não é tão facil rodar ele em qualquer smatphone ainda…) e usar o f-droid, uma marketplace que distribui software livre para mobile.

  6. As argumentações de excluir ubuntu só por conta de não ser código livre, são fracas. Uso linux desde 1998, já passei por slack, fedora, debian, ubuntu, mandrake, etc. Essa ideia de fragmentação das comunidades e distribuição que enfraquece o movimento linux. O cara veio para o mundo linux e precisa ver vídeos, escutar mp3, gravar um dvd, então não poderá ser usuário linux (na visão da petição). A adoção massiva de linux, se dará nas empresas, onde existe muito software proprietário, drivers de storage, redes, segurança, etc.

    1. Wellton Costa

      só para esclarecer: Não estamos aqui pelo “movimento linux”, estamos aqui pelo movimento software livre do GNU.

      E só para avisar, você é OSI e nem sabe. Em 97 OSI iniciou como uma alternativa ao Software Livre, logo… são coisas distintas atualmente.

  7. Só um adendo ao texto.
    Achar que estamos propondo uma migração direta e dolorosa é o que faz com que chamem qualquer um que defenda software livre de xiita.

    Eu vou me repetir mais uma vez nessa lista de comentários (o fiz no texto da petição e em algumas respostas à mesma…).

    Quem defende software livre não quer que você que não defende seja excluido do mundo, só quer que, onde o foco é sofware livre, que seja ele ora bolas.

    Vamos tomar como exemplo a nota que o Stallman fez a respeito da carta do Tiago Paixão, Stallman alí, diz que está contente com a decisão do Tiago de tomar um lado e que espera que nos próximos FLISOL sejam intensificadas essas ações.

    Se começamos com a ferida mais dolorida, com o tempo, fechamos as menos doloridas.

    Ninguém é obrigado a ter um hardware que comporta só software livre de cara e mudar para um trisquel ou parabola com tudo funcionando, sério, ninguém, porém, repassar o conhecimento de forma correta sobre o que é o movimento software livre e deixar nas mãos do usuário, após o mesmo ser instruido, se é isso mesmo que ele quer ou se prefere usar software privativo é nossa obrigação.

    No fim das contas, o que impera é uma falta de interpretação de textos (claro que isso não é exclusividade daqui, é da internet como um todo). Onde muitas vezes, seja por desavenças pessoais, ideológicas ou quaisquer que sejam, ignora-se a mensagem e se parte para o ataque.

    Bom, vamos continuar na propagação ai do software livre e simbora que o caminho é longo.

    Saudações.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *