Ativistas Convertidos

Em plena batalha pelo Marco Civil decido levantar a pulha dos sistemas e ambientes proprietários e de desrespeito de privacidade. Que tombo! Quebrei a cara. Fui convidado a não pregar para os convertidos.

O Macro Civil é o nome da PL 2126/2011 que está em tramitação na Câmara dos Deputados, e esse é um lindo projeto que vai se converter em nosso pior inimigo, muito em breve. O MC foi originalmente escrito para proteger os usuários dos desmandos dos grandes oligopólios das telecomunicações e de vontades espúrias de governos pouco escrupulosos. Traduzindo: para evitar desmandos sobre a rede mundial de computadores.

Esse é um projeto de lei extenso, que contem valiosas pérolas de contenção de possíveis abusos por parte dos poderes malévolos, mas três se destacam: “notice and take down”, neutralidade da rede e privacidade. Não pretendo entrar em maiores detalhes sobre o Marco Civil da Internet. Pode-se facilmente encontrar material sobre isso espalhado na web. Meu enfoque é outro.

Infelizmente os podres poderes estão ganhando terreno e com o apoio dos Ministros do Governo Dilma, estão conseguindo modificar os artigos pertinentes a esses três pontos, para atender às suas demandas, ou seja, em breve será legal remover conteúdo da Internet sem ordem judicial, será legal criar regras de acesso diferenciadas por tipo de conteúdo e será legal, também, ler os cabeçalhos de sua comunicação, invadindo a sua privacidade de forma direta e sem nenhum tipo de controle.

Então a sociedade civil, especialmente os atores que participaram da redação original do Marco Civil, está reagindo às investidas de modificação do texto, tentando minimizar os estragos dentro desse nojento processo de negociações do legislativo brasileiro. Eu me incluo no grupo que está se mobilizando, do jeito que é possível, para enfrentar esses cancros.

Mas foi exatamente em uma dessas discussões sobre métodos e formas de fazer mobilizações, que surgiu o cerne motivador deste artigo: faz sentido buscar preservar o Marco Civil, em especial o que tange a privacidade, utilizando ferramentas e redes sociais perniciosas e vis como FaceBook?

Mandei o seguinte conteúdo para o debate:

<inicio>

Que maravilha essa imagem!

Mas não é meio besta que ela esteja compartilhada exatamente pelo FaceBook?

Digo, é aceitável que o FaceBook monitore tudo que os usuários fazem, mas não as telefônicas?

Será  que não é hora de todos nós, ativistas, revermos nosso conceitos e concessões tecnológicas que temos feito nos últimos anos?

Para  mim é absolutamente incongruente que defendamos a privacidade dos usuários e a neutralidade da rede e imediatamente depois, utilizemos as ferramentas campeãs de monitoramento, rastreamento e de fomento de agências como FBI.

Defendo a privacidade usando o Facebook como ferramenta.

Apoio o plantio orgânico usando sementes da Monsanto.

Sou Vegano usando minha jaqueta de couro.

Sou defensor/simpatizante do Software Livre usando Windows, Skype e/ou Mac/iPad/iPhone.

Faz sentido?

<fim>

E foi ai que veio a resposta que entitula este relato surgiu: não pregue para os convertidos. O argumento é que se os meios para alcançar a maior quantidade possível de pessoas é utilizando meios de comunicação que não respeitam nenhuma privacidade e ainda compartilham suas informações com o FBI. Então tudo bem.

O argumento é bom, mas falho. Usar Windows, Skype, Gmail e Facebook não deveria ser uma opção para qualquer ativista realmente comprometido com uma mudança séria para um Mundo Melhor. Não faz nenhum sentido. É como justificar o uso de reatores atômicos porque energia elétrica é necessária, e fazer ativismo a favor dos meios “limpos” de geração. Usar tecnologia proprietária que só beneficia as mega corporações e os governos imperialistas, como os USA, trará, sempre, mais prejuízos do que ganhos. Especialmente para um ativista social.

As redes sociais são os novos mecanismos de vigilância das agências de inteligência dos países imperialistas. E qualquer tentativa de burlá-las é considerada uma ofensa. Vide a proibição do uso de criptografia nos USA, Inglaterra, Alemanha e Japão. E das iniciativas legais para impedir a privacidade a todos custo, como o exemplo do governo japonês tentando tornar ilegal o uso do TOR.

Os governos tem se associado às principais redes sociais, que não sem querer são dos USA, e tem fomentado o seu uso pelo Mundo. As redes estão quase sempre associadas a um estilo jovem e descolado de ser. Vende-se a imagem de ser uma ferramenta socialmente útil, para organizar trabalhos voluntários e até mobilizações das massas insurgentes, como nos movimentos da chamada Primavera Árabe, e até certo ponto isso não deixa de ser verdade. Assim como a energia elétrica é algo extremamente positivo, as redes sociais também o são. O problema está em sua geração. Se for de hidro-elétrica, tudo bem, mas de energia nuclear, não. Neste caso há de se tomar o mesmo cuidado. O Facebook, por exemplo, permite as mobilizações sociais, mas acessando suas bases de dados, em tempo real, estão o FBI e a CIA, coletando o cotidiano de todos os usuários e traçando perfis de comportamento das massas.

Temos que buscar alternativas livre e seguras, livres de monitoramento e parar de tapar o Sol com a peneira. Parar de se enganar e criar desculpas que tornam nossa complacência cada vez maior com as ferramentas do inimigo.

Que me desculpem os mais cegos, mas não há ativismo que vença utilizando essas ferramentas monitoradas. Os podres poderes estarão sempre um passo a frente, pois vocês alimentam suas escutas e permitem que eles saibam de tudo, de cada movimento, de cada protesto, de cada iniciativa, de cada ação. Essas ferramentas são escutas eletrônicas em cada mensagem digitada, em cada ideia trocada, em cada e-mail, em tempo real.

O pior de todos os convertidos é aquele que acha que é um convertido. Se luto pelo combate à corrupção, não preciso me preocupar com as ferramentas tecnológicas que uso, afinal de contas eu não sou um cyber-ativista. Se luto pela energia limpa, também não. Entretanto esse é um argumento ingênuo que só trás mais e mais poder aos meios digitais de controle e dominação das históricas forças do mal. Por trás de todas as iniciativas que poluem, corrompem, degradam, escravizam, exploram e matam por ganância, está uma ferramenta tecnológica proprietária e sua super capacidade financeira para ajudá-las. Pense nisso.

Eu não sou um ativista convertido. Eu tento me converter todos os dias, ouvindo os argumentos e tentando ser o mais coerente possível.

Acho que está na hora dos principais expoentes dos movimentos ativistas sociais do mundo acordarem e recrudescerem suas posições sobre quais ferramentas podem e quais não podem ser utilizadas!

Quer fazer seu ativismo aparecer e atingir realmente para a maior quantidade possível de pessoas? Coloque um anúncio de 30 segundos no intervalo do Jornal Nacional e outro na novela das nove. É menos ruim.

Saudações Livres!

@anahuacpg

 

P.S. – Aos que se perguntam qual era a imagem, segue o link: https://fbcdn-sphotos-c-a.akamaihd.net/hphotos-ak-ash4/317440_637106092982637_1901821808_n.jpg

Alternativa livre ao Facebook – Diaspora: http://www.trezentos.blog.br/?p=7892

1 comentário em “Ativistas Convertidos”

  1. Pingback: Software Livre: que liberdade é essa? | Anahuac

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